terça-feira, 6 de agosto de 2013
AQÜICULTURA FAMILIAR
ESTUDO
SETORIAL PARA
CONSOLIDAÇÃO DE
UMA AQÜICULTURA
SUSTENTÁVEL NO
BRASIL – SUMÁRIO
EXECUTIVO
O objetivo deste trabalho foi realizar um diagnóstico detalhado da aqüicultura
brasileira, a partir de uma análise mais ampla não restrita apenas à abordagem de
temas técnicos ou político‐institucionais. Tais temas foram levantados, mas
também complementados com a análise de aspectos históricos da atividade; com
uma avaliação dos problemas e das soluções ambientais a ela associadas; com seu
papel no desenvolvimento social do país; com uma visão das interações entre as
questões econômicas e estruturais do próprio país com a sua aqüicultura; das
interações entre essa mesma aqüicultura com outras cadeias produtivas; da visão
que a sociedade civil organizada tem da aqüicultura e, acima de tudo, dos entraves
enfrentados e das possíveis soluções para se inserir de fato a aqüicultura no rol das
atividades de reconhecida importância no agronegócio brasileiro.
Sumário executivo
Grupo Integrado de Aqüicultura e Estudos Ambientais
Página |18
BRASIL
Dados Demográficos/Geográficos1
População* 180.000.000 habitantes
Área 8.514.876,6 km2
Linha de costa 7.367 km
Regiões climáticas
Tropical (90% do território), Equatorial, SemiÁrida,
Tropical de Altitude e Subtropical.
Dados hidrológicos2
Águas doces superficiais
13,8 % do total mundial
34,9 % do total das Américas
56,9% do total da América do Sul
Distribuição por Região
Norte:.................................. 68 %
Centro‐Oeste:...................... 16 %
Sul:...................................... 7 %
Sudeste:............................... 6 %
Nordeste:............................ 3 %
Reservatórios públicos e
privados
8,5 milhões de hectares
Produção aqüícola3
Produção pesqueira total
(pesca + aqüicultura)*
1.015.916 toneladas
Produção aqüícola*
269.697,50 t (total)
180.730,5 ( aqüicultura continental)
88.967 t (maricultura)
Participação da
aqüicultura na produção
total do Brasil
26,5%
Receita gerada pela
atividade
US$ 965.627,60
Consumo de pescados per
capita estimado
5,9‐7,0 kg/habitante/ano
BRASIL EM NÚMEROS
Ensino, Pesquisa e Extensão na área de aqüicultura4 :
Institutos de pesquisa Número total: 89
Cursos em áreas correlatas
16 ‐ Nível Médio
42 ‐ Graduação
28 ‐ Especialização
27 ‐ Mestrado
13 ‐ Doutorado
Número de entidades: 27
− 15 Empresas Públicas de Direito Privado
− 5 Autarquias Estaduais
− 3 Empresas Mistas
− 2 Sociedades Civis de Direito Privado
− 2 Administração Direta dos Estados
Extensão Rural
Municípios atendidos: 4.500
Logística5 :
Número total: 66
Aeroportos
Carga anual transportada: 1.214.613 t
Ferrovias Carga anual transportada: 345.096.000 t
Portos: 39
Terminais Privados: 43
Portos
Carga anual transportada: 529.005.051 t
Contêineres anuais: 2.280.009
Transporte rodoviário
Malha rodoviária: 1.751.862 km
Trechos pavimentados: 12%
Trechos não‐pavimentados: 88%
Condições das rodovias:
‐ Ótimo/bom: 21%
‐ Péssimo, ruim ou deficiente: 79%
Cargas transportadas: 65% do total nacional
Processamento/Transformação
de pescados (certificados pelo
Serviço de Inspeção Federal)
304 ‐ Entrepostos de pescados
38‐ Fábricas de pescado ou conserva
de peixes
34 ‐ Barcos‐fábrica
A PRODUÇÃO AQÜÍCOLA BRASILEIRA
Por: Nádia Rita Boscardin
Neste capítulo são apresentados os dados oficiais da produção aqüícola brasileira,
sua inserção no contexto mundial e a forma como está sendo desenvolvida no país.
Segundo esses dados, em 2004, a produção aqüícola e pesqueira brasileira
alcançou, um volume de 1.015.916 toneladas o que representou um acréscimo de
2,6% em relação ao ano de 2003. A aqüicultura participou com 26,5% (269.697,50
toneladas) na produção total do Brasil, gerando US$ 965.627,60.
Os principais organismos, em termos de volume, cultivados no Brasil, são os peixes
(principalmente tilápia, carpas e o tambaqui), o camarão branco do Pacífico
(Litopenaeus vannamei) e o mexilhão (Perna perna). Como cultivos emergentes na
aqüicultura brasileira destacam‐se os peixes marinhos (basicamente bijupirá,
Rachycentron canadum), as macroalgas e os cultivos de pirarucu em água doce,
desde que resolvidos os problemas técnicos existentes na produção de alevinos.
A região Sul liderou a produção da aqüicultura continental em 2004, com a 34%,
baseada principalmente no cultivo de carpas e tilápias. Na segunda colocação,
apareceu a região Nordeste, com 22%, focada no cultivo de tilápias e de tambaquis.
A seguir veio a região Centro‐Oeste, com o equivalente a 18% da produção
nacional, alavancada pela produção do tambacu, pacu, tilápia e tambaqui. Com
uma produção de 17%, baseada na produção de tilápia, carpa, truta, tambacu e o
tambaqui, a região Sudeste ficou com a quarta posição. A região Norte, por sua vez,
contribuiu com 10% da aqüicultura continental, ancorada basicamente pelo cultivo
do tambaqui.
A produção brasileira da aqüicultura marinho‐estuarina foi de 88.967 toneladas ou
o equivalente a 33% da produção nacional sendo que a região Nordeste
responsável por 79,5% da produção de organismos aquáticos marinhos,
representada pelos cultivos de camarões. A região Sul ficou na segunda posição,
com 19%, fortemente ancorada pelo cultivo de mexilhões e ostras. A
representatividade nas Regiões Sudeste e Norte foi pequena, registrando 1% e 0,3%
respectivamente no total produzido pela maricultura brasileira.
Dentre os sistemas de cultivo empregados, destaca‐se o uso de viveiros, geralmente
manejados em regime semi‐intensivo de produção (usados nos cultivos de peixes e
de camarões) e os long‐lines (empregados nos cultivos de mexilhões e ostras). A
produção de peixes em tanques‐rede apresenta um enorme potencial para se
desenvolver no país, desde que sejam desatados os nós burocráticos e legais para
legalização do direito ao uso de espaços da União para fins de aqüicultura.
PRINCIPAIS SISTEMAS PRODUTIVOS EMPREGADOS
COMERCIALMENTE
Por José Roberto Borghetti e Ubiratã Assis Teixeira da Silva
A aqüicultura brasileira é baseada em regimes semi‐intensivos de produção e, com
exceção do setor da carcinicultura, a produção é sustentada principalmente por
pequenos produtores. Como exemplo, enquadram‐se os cultivos de camarões marinhos,
que empregam uma tecnologia relativamente bem desenvolvida de produção,(básico) da qualidade da água. Também é desenvolvida em regime semi‐intensivo a
maioria dos cultivos de peixes realizados em viveiros escavados, onde os alevinos são
estocados e alimentados com ração durante todo o período de cultivo.
Porém, há casos bem sucedidos em que a produção é realizada em regime extensivo.
Nesse caso enquadram‐se os cultivos de peixes realizados por pequenos produtores da
região Sul, especialmente em Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Em tais cultivos
raramente se usam rações comerciais e os peixes são alimentados, tradicionalmente,
com subprodutos agrícolas ou dejetos animais.
Também podem ser considerados regimes extensivos de produção os sistemas que
envolvem o povoamento de grandes reservatórios de água, notadamente na Região
Nordeste.
A malacocultura utiliza espécies filtradoras (ostras e mexilhões); há pouca tecnificação e
os cultivos são realizados em áreas costeiras abrigadas, sendo comuns os conflitos de uso
com outras atividades econômicas. Tais características permitem classificar essa atividade
também como um regime extensivo de produção.
O capítulo ainda aborda os principais sistemas empregados na aqüicultura e aspectos
históricos e técnicos relativos às espécies responsáveis pela maior parte da produção
aqüícola nacional (de peixes, rãs, camarões de água doce, camarões marinhos, ostras e
de mexilhões).
O PAPEL DO PODER PÚBLICO NO DESENVOLVIMENTO DA
AQÜICULTURA BRASILEIRA
Por: Walter Antonio Boeger e José Roberto Borghetti
Este capítulo começa apresentando um histórico da aqüicultura, indicando,
principalmente a forma como a atividade foi se inserindo no contexto econômico
do país e na estrutura administrativa do Estado. Nele é apresentado um panorama
que se estende desde os primeiros cultivos de peixes, realizados em sistema
extensivo durante a invasão holandesa no Nordeste no século XVIII; passando pelo
início da fase comercial da aqüicultura, nos anos 1960; pela fase do "não pode",
nos anos 1990, quando a aqüicultura brasileira foi fomentada pelo IBAMA, órgão de
fiscalização ambiental e de repressão; pela fase de "luta" para que a aqüicultura
ficasse sob a responsabilidade de uma estrutura verdadeiramente de fomento à
produção e chegando até os dias atuais, com a criação da SEAP.
Em seguida, é apresentado o arcabouço institucional atual em que a aqüicultura
está inserida, bem como os principais órgãos e instituições com os quais se
relaciona diretamente (SEAP/PR, IBAMA, sp.U, ANA e Ministério da Marinha).
Por fim, são apresentados os marcos regulatórios da atividade, bem como os
principais programas institucionais atualmente em execução e que apresentam
potencial para o desenvolvimento da atividade no país (Programa de Parques
Aqüícolas, bem como o processo de Cessão de Águas de Domínio da União para
Fins de Aqüicultura, o Programa Nacional de Controle Higiênico e Sanitário de
Moluscos Bivalves, os Planos Locais de Desenvolvimento da Maricultura, o Plano
Nacional de Gerenciamento Costeiro, o Programa de Áreas Protegidas Marinhas de
envolvendo: o uso de viveiros‐berçário, de ração comercial, de aeradores e controleORGANIZAÇÃO E ADMINISTRAÇÃO DO SETOR PARA O
DESENVOLVIMENTO DA AQÜICULTURA
Por: Débora Pestana, Márcio Roberto Pie e Robert Willian Pilchowski
Neste capítulo são inicialmente apresentadas definições sobre termos
fundamentais para a compreensão da estrutura da aqüicultura brasileira como:
Aqüicultura Comercial ‐ aquela que visa a geração de renda financeira através da
produção de plantas e animais que são demandados no mercado; Aqüicultura de
Subsistência ‐ aquela cuja produção não atinge escala de produção comercial,
evidenciando a produção destinada ao sustento familiar; Aqüicultura Familiar ‐
uma forma de produção onde predomina a interação entre a gestão e o trabalho. É
estabelecimento integrante da agricultura familiar aquele dirigido pelo próprio
produtor rural e que utiliza mais a mão‐de‐obra familiar que a contratada;
Aqüicultura Industrial – que pressupõe a associação a regimes mais intensivos de
produção e, concomitantemente, a existência de uma cadeia produtiva bem
estruturada.
A seguir, abordam‐se temas sobre a estrutura de apoio à aqüicultura existente no
país. Inicia‐se com a estrutura oficial de assistência técnica e extensão rural
existente e que envolve 27 entidades estaduais, sendo 15 empresas públicas de
direito privado, cinco autarquias estaduais, três empresas públicas por ações,
duas sociedades civis de direito privado, duas de administração direta dos
estados. A extensão rural conta ainda com 19,5 mil empregados, 12,5 mil técnicos,
260 escritórios regionais, 4.240 escritórios locais, 4.500 municípios atendidos, 37
mil comunidades assistidas, 1,3 milhão de produtores assistidos.
A ênfase no tema "Organizações Comunitárias" é dada à estrutura, à importância e
às implicações legais de organizar os produtores em associações e cooperativas.
Há, no entanto, uma nítida carência de representatividade do setor produtivo em
tais associações. Em relação à aqüicultura, a despeito da crise por que passa a
carcinicultura nacional, com reflexos financeiros evidentes na própria Associação
Brasileira de Criadores de Camarão, ela se mantém como a principal entidade
privada representativa do setor aqüícola nacional. Também não é característica da
aqüicultura brasileira a presença de grandes cooperativas aqüícolas. A maioria
delas é de pequeno porte e apresenta atuação regional.
No tópico sobre linhas e programas de crédito para investimento e custeio de
atividades aqüícolas é mostrado que, ao menos no papel, existem meios de se
obter financiamento para as atividades aqüícolas. Como foi discutido em capítulos
posteriores, o problema é que a obtenção do crédito é um processo extremamente
burocrático e caro.
Segurança alimentar é outro ponto‐chave para a sustentabilidade da aqüicultura
nacional. O problema é que o Brasil está apenas ingressando na fase de
profissionalismo da aqüicultura. Contratos formais entre produtores e comerciantes
ou entre produtores e indústrias processadoras ainda são raros. Por isso, antes de
se falar em preocupações com a segurança alimentar, os aqüicultores brasileiros –
especialmente, mas não exclusivamente, os aqüicultores familiares ‐ terão que se
familiarizar com prazos de entrega, quantidades, condições do transporte e
conservação do pescado, tamanho e uniformidade, coloração, ausência de offflavor,
coloração da carne ou pele, entre outros critérios. Esses são aspectos
fundamentais para se garantir a segurança dos alimentos produzidos e
comercializados. O mesmo vale para a aplicação dos princípios da APPCC (Análise
de Perigos e Pontos Críticos de Controle, ou HACCP, em inglês), que consiste em
uma série de etapas inter‐relacionadas, que independem do processo industrial
para o qual é adotado, o que permite a sua aplicação nos diversos segmentos do
setor alimentício, como é o caso dos pescados, em todas as fases do processo,
desde a produção primária até a comercialização. A aqüicultura brasileira começa a
despertar para a necessidade de implantação de tais sistemas de qualidade.
No tópico "impactos sociais da aqüicultura e seu papel na geração de emprego e
renda" é mostrado que a aqüicultura brasileira tem um imenso papel na fixação do
homem nas zonas rurais e litorâneas e, mais do que gerar empregos, ela tem um
papel muito importante na geração de renda em escala familiar. Portanto, a
atividade não deve ser avaliada apenas com base na sua importância econômica,
mas principalmente pela sua importância social.
PRINCIPAIS PROBLEMAS ENFRENTADOS ATUALMENTE PELA
AQÜICULTURA BRASILEIRA
Por Antonio Ostrensky e Walter Antonio Boeger
Este é um capítulo essencial para a estruturação do trabalho: identificar os
problemas que afetam os diferentes setores da cadeia produtiva da aqüicultura
nacional.
As duas metodologias utilizadas na execução do trabalho foram justamente seu
diferencial. A primeira, através do envio de questionários a cerca de 800 pessoas
que representam os diversos setores da aqüicultura nacional (destes, 56 ou 7% do
total, responderam). A segunda foi pela avaliação das mensagens trocadas entre os
participantes da lista de discussão da Revista Panorama da Aqüicultura (Panorama‐
L). Essa é a principal revista brasileira relacionada à aqüicultura e disponibiliza aos
interessados pela atividade ‐ não só para os assinantes da revista, mas também ao
público em geral ‐ um espaço virtual, livre, aberto e gratuito, para que se possa
discutir, trocar informações, tentar encontrar soluções para os problemas
enfrentados pelas pessoas e empresas que militam no setor. Os participantes da
lista representam praticamente todos os elos da cadeia produtiva da aqüicultura
nacional, desde fornecedores de insumos, serviços e equipamentos, passando por
representantes do setor público, instituições de ensino, processadoras e
comerciantes. Essa pluralidade de participantes é o que confere especial interesse
às discussões travadas nesse fórum.
Com base nas metodologias aqui utilizadas, foi possível apontar os três maiores
problemas que afetam o setor aqüícola brasileiro:
‐ Problema técnico‐gerencial: falta de treinamento e qualificação técnica na cadeia
produtiva da aqüicultura;
‐ Problema econômico/administrativo: dificuldade de acesso ao crédito para
investimento e custeio em aqüicultura;
‐ Problema político‐administrativo: falta de políticas públicas consistentes para o
desenvolvimento da atividade.
Neste capítulo foram ainda tratados de temas que afetam diretamente a
viabilidade e a sustentabilidade da aqüicultura brasileira, tais como: problemas de
logística, corrupção, carga tributária excessiva, dificuldades de acesso ao crédito,
bem como os marcos legais da atividade.POTENCIAL PARA O DESENVOLVIMENTO DA AQÜICULTURA
NO BRASIL
Por Antonio Ostrensky, Walter Antonio Boeger e Marcelo Chammas
O setor primário de produção de pescados (pesca + aqüicultura) representa quase
0,4% do PIB. Contudo, se considerada toda a cadeia produtiva de pescados,
englobando desde a produção de rações e embalagens até o transporte e o
processamento, entre outros, a contribuição do setor salta para cerca de 2% do
PIB (SEAP, 2005). Se a possibilidade de expansão em patamares verdadeiramente
sustentáveis da atividade pesqueira é bastante duvidosa, o mesmo não se pode
dizer da aqüicultura, cujo potencial de expansão é seguramente promissor.
Dentre todos os fatores positivos, que podem ser explorados para o
desenvolvimento da aqüicultura brasileira, nenhum é mais importante que as
enormes potencialidades naturais. O Brasil possui 7.367 km de costa; 3,5 milhões
de hectares em águas públicas represadas; 5 milhões de hectares em águas
privadas represadas; apresenta clima preponderantemente tropical; é autosuficiente
na produção de grãos; concentra cerca de 12% da água doce disponível
no planeta; apresenta abundância de água doce em praticamente todas as suas
regiões.
Por outro lado, os números também recomendam que se tome a devida cautela,
para se conter eventuais excessos de otimismo. O fato da maior concentração de
recursos aquáticos esta concentrada na região Norte e Centro‐Oeste, onde a
densidade populacional é menor, implica em uma infra‐estrutura deficiente para
comércio e transporte dos produtos aqüícolas. Além disso, na região Norte há
uma significativa concorrência com a pesca extrativa. Portanto, mesmo em
relação às suas potencialidades há desafios a serem superados para o
desenvolvimento da aqüicultura.
O Brasil também possui um imenso contingente de pequenas propriedades rurais
e de produtores que diversificam os produtos cultivados para diluir custos,
aumentar a renda e aproveitar as oportunidades de oferta ambiental e
disponibilidade de mão‐de‐obra. Por ser diversificada, a agricultura familiar traz
benefícios agro‐socioeconômicos e ambientais. E é justamente essa possibilidade
de utilização da aqüicultura por produtores familiares, associada à grande
disponibilidade de recursos naturais do Brasil, que permitem afirmar que há uma
imensa disponibilidade de mão‐de‐obra (ainda que não qualificada) para o
desenvolvimento da atividade no país.
Outra vantagem comparativa do país é a grande disponibilidade de estruturas
qualificadas para a capacitação de pessoal e realização de pesquisa e
desenvolvimento. Atualmente existem 89 instituições de pesquisa envolvidas com
a aqüicultura no país. Essas instituições oferecem 16 cursos de nível médio, 42
cursos de graduação, 28 cursos de especialização, 27 cursos de mestrado e 13
programas de doutorado no setor.
Além disso, temos indústrias instaladas fornecendo serviços, equipamentos, e
insumos para a aqüicultura; uma estrutura relativamente adequada de produção
de formas jovens (larvas, pós, larvas, alevinos e juvenis) dos principais organismos
aquáticos cultivados. Por outro lado, a indústria de processamento e
transformação de produtos aqüícolas apenas dá seus primeiros passos. A maioria
delas tem menos de 1 ano de existência.Por fim, temos no país um universo de 185 milhões de consumidores em
potencial, o que gera uma demanda anual da ordem 1,1 milhão de toneladas de
produtos de origem aquática. Ora, se a produção aqüícola brasileira em 2004 foi
de aproximadamente 270.000 toneladas, segundo os dados oficiais, já há uma
demanda de mercado no país, cerca de quatro vezes maior que a produção
aqüícola atual. É preciso agora que haja uma profissionalização da cadeia
produtiva da aqüicultura para conquistar esse mercado.
AQÜICULTURA, SEGURANÇA ALIMENTAR, SANIDADE E MEIO
AMBIENTE
Por: Gisela Geraldine Castilho, Leandro Ângelo Pereira e Márcio Roberto Pie
O termo "ambientalmente sustentável" tem predominado nos debates sobre
aqüicultura, apesar de tais debates ainda não terem gerado medidas práticas de
grande amplitude. Pelo menos no Brasil, estudos sobre sustentabilidade ainda
estão voltados exclusivamente para os aspectos ambientais da produção. Os
aspectos sócio‐econômicos, por exemplo, são pouco conhecidos e pouco
estudados. A proposta deste capítulo é justamente fazer um apanhado desses
temas, analisando de que forma eles afetam a aqüicultura brasileira atualmente.
A carcinicultura é uma atividade que vem sendo tratada como a grande vilã do
meio ambiente no país. Talvez nenhuma outra atividade produtiva da economia
brasileira venha recebendo tamanhas críticas quanto os empreendimentos de
cultivo de camarões marinhos.
O que se observa é que o ódio de setores organizados da sociedade destilado
contra a aqüicultura é diretamente proporcional ao tamanho dos
empreendimentos, o que leva a supor – sem prejuízo às reais responsabilidades
que o setor tem – que há, sim, um forte componente político/ideológico nas
críticas que a atividade recebe. Grandes empreendimentos de carcinicultura são
alvos de críticas pesadas. O imenso somatório de pequenos empreendimentos de
piscicultura espalhados por todo o país e os pequenos e ainda pouco numerosos
empreendimentos de malacocultura, têm sido poupados de maiores críticas. Por
enquanto... A perspectiva é que com a instalação de grandes empreendimentos
em águas públicas, o tom das críticas suba.
Por isso, mais uma vez, a saída para o setor passa pela profissionalização. A
aqüicultura depende da existência de um ambiente estável e equilibrado para sua
própria sustentabilidade. Desequilíbrios ambientais são a porta de entrada da
instalação de epizootias em qualquer atividade agropecuária. Por isso, a
aqüicultura depende fundamentalmente da existência de água de boa qualidade.
Assim, a preocupação com as questões ambientais deve partir do próprio setor
aqüícola.
Talvez, a forma mais efetiva de se trabalhar essa questão seja através de uma
prática comum no mercado aqüícola internacional e também em outras cadeias
produtivas nacionais: o incentivo à adoção de práticas para melhorar o manejo
dos sistemas de produção aqüícolas, ao invés de se impor limites quanto aos
parâmetros físico‐químicos para a qualidade de água. Exemplo disso é o "Rótulo
Verde" ou ISO 14.000. A proposta é que os aqüicultores possam conduzir suas
atividades de maneira ecologicamente correta e que assegure a obtenção de um
certificado de qualidade ambiental. Tal certificado pode significar uma maior
aceitação dos produtos de origem aquática nos mercados nacional e internacional.
O fato é que a questão ambiental na aqüicultura ainda está muito longe de ser
tratada de forma séria e correta por cada um dos atores envolvidos, sejam eles
produtores, órgãos oficiais de fomento, de fiscalização ambiental e de
organizações não governamentais. O risco desse descontrole é que o
desenvolvimento da aqüicultura passe a depender fundamentalmente de fatores
políticos e ideológicos, enquanto os fatores técnicos ou econômicos acabem
relegados a um plano inferior.ASPECTOS DA VIABILIDADE ECONÔMICA DA AQÜICULTURA
EM PEQUENA E MÉDIA ESCALA
Por: Débora Pestana e Antonio Ostrensky
Uma das fantasias que se tem em relação à aqüicultura é que seria possível
viabilizar toda a atividade apenas com base no incremento da oferta. Por isso, não
raro, os programas de fomento à aqüicultura tratam quase que exclusivamente de
ações voltadas ao aumento da oferta, preocupando‐se nada, ou quase nada, com
questões vinculadas à demanda, tais como: qualidade e padronização dos
produtos, regularidade na sua oferta e preços.
Outra ilusão é de que basta que um produto seja produzido por pessoas de baixa
renda ou por comunidades tradicionais para que ele passe a ter um forte apelo
social. Idéia completamente falsa! O conceito de ambientalmente sustentável e
socialmente justo, bem como o apelo de haver geração de emprego e renda para
as comunidades mais necessitadas, só podem ser considerados se não estiverem
dissociados da realidade do mercado de alimentos, onde fatores como preço
baixo, qualidade alta, regularidade de oferta e marketing são elementos básicos
para o sucesso de qualquer iniciativa.
Neste capítulo são apresentados exemplos e estudo de casos que mostram como
o consumo e outras questões vinculadas ao mercado afetam a viabilidade da
aqüicultura. Mostra como é complexo e árduo o trabalho para a viabilização da
aqüicultura desenvolvida em pequena e média escala no país.
O ingresso de pescado no mercado nacional se dá tanto pela produção interna,
via pesca e aqüicultura, quanto pela importação de pescados, totalizando
1.174.575 t em 2004. Como parte da produção nacional é exportada, o saldo
(positivo) da quantidade de pescado que permanece no mercado nacional chega a
1.067.558 t. Como em 2004 a população brasileira era de 181.586.030 habitantes,
a divisão do valor citado anteriormente pelo número de habitantes gera um
consumo per capita de apenas 5,9 kg/hab/ano. Dados do IBGE apontam para um
valor também muito próximo a esse, no caso de 7,0 kg/hab/ano. Esses números
ainda são muito modestos, de forma que a expansão da base produtiva nacional
passa também do aumento do consumo per capita de pescados.
A viabilidade econômica do setor aqüícola, por sua vez, envolve a manutenção
dos mercados já conquistados e a abertura de novos mercados. No texto, são
analisados temas como a interação entre pesca e aqüicultura, a venda de matériaprima
para pesque‐pague, a venda em centros atacadistas, a industrialização e a
exportação.
O marketing institucional tem como objetivo trabalhar a identidade, a formação e
a consolidação da imagem de um programa, de um projeto ou de todo um setor,
no caso aqui tratado, o da aqüicultura. A história recente mostra que o marketinginstitucional é, cada vez mais, uma ferramenta importante para o
desenvolvimento setorial. Por outro lado, sem instituições fortes não há como se
trabalhar adequadamente ações de marketing "institucional". As instituições
brasileiras da área de aqüicultura, sejam elas governamentais ‐ como é o caso da
própria SEAP ‐, ou privadas – como é o caso da ABCC ou das empresas do setor
produtivo, de processamento ou comercialização ‐ precisam, antes de mais nada,
conseguir se estruturar e agregar em torno de si as marcas, pessoas, setores e
instituições a que se propõe e representar. Jamais teremos uma aqüicultura forte
no país sem a existência de instituições fortes.
REFLEXÕES SOBRE AS BASES TÉCNICAS E CONCEITUAIS PARA
O DESENVOLVIMENTO DA AQÜICULTURA NO BRASIL
Por: Marcelo Acácio Chammas
O desafio neste capítulo é o de suscitar reflexões, discussões e apresentar
propostas de baixo custo e alto impacto para enfrentar os problemas identificados.
Para facilitar a compreensão, os problemas e propostas apresentados foram
aglutinados em três grandes blocos: licenciamento ambiental, a questão da
qualidade e o enfoque específico nas cadeias produtivas.
Com relação ao licenciamento, conclui‐se que o impasse entre os pró‐aquicultura e
seus contrários há muito já esgotou o limite do bom senso. De ambas as partes
costuma prevalecer uma visão míope e o uso, por vezes mal intencionado, de
meias‐verdades. Para que seja possível avançar, há que se partir de um ponto
concreto e inquestionável: a existência de bons e maus empreendimentos em todos
os setores da economia.
Para avançarmos é preciso admitir que não existem soluções mágicas e nem
soluções de atacado. O processo de licenciamento deve ser suficientemente
eficiente para, ao mesmo tempo, cumprir o seu papel na manutenção do equilíbrio
ambiental, sem penalizar toda a atividade.
Qualidade e produtividade, por sua vez, são fatores‐chave para a competitividade
de qualquer cadeia produtiva, não sendo diferente na aqüicultura. Para que a
atividade conquiste maiores e melhores mercados, é imprescindível que ela tenha
diferenciais competitivos (custos reduzidos, produtos característicos, produção
padronizada, ofertas regulares, etc.) e que ofereça ao consumidor o máximo de
garantias (selos, certificações, rastreabilidade, licenças, etc.). Ademais, também é
fundamental que ela se consolide como atividade sustentável e usuária racional de
recursos naturais e divulgue bem essa imagem.
Já em relação às cadeias produtivas, o trabalho de apontar e propor alternativas
para superação dos principais pontos críticos da aqüicultura brasileira não se
encerrará, nem mesmo após a desobstrução dos gargalos destacados neste
trabalho. Pois, no momento em que estes forem superados, novos estarão se
evidenciando ou surgindo e conseqüentemente o processo deverá ser retomado. É
essa necessidade de aprimoramento com base na realidade nua e crua dos fatos
que impõe a evolução como única forma de sobrevivência da aqüicultura.
PROPOSTAS ESTRUTURAIS E EXECUTIVAS PARA
CONSOLIDAÇÃO DA AQÜICULTURA BRASILEIRA
Por: Antonio Ostrensky
Neste último capítulo, o objetivo é apontar caminhos que possam contribuir para a
sua resolução. Mas, esta está longe de ser uma tarefa fácil. Aliás, propor soluções,
sugerir mudanças, opinar, tudo isso é, sim, relativamente simples. Difícil é propor
soluções realmente transformadoras da realidade. Por exemplo, se o problema é
do tipo "falta de investimentos em...", a solução natural seria propor "investir
em...". Isso seria o óbvio, mas geraria outro problema: "investir com que
recursos?" "Soluções para problemas" e "recursos financeiros" são quase sempre
fatores indissociáveis. Contudo, no mundo real os recursos financeiros costumam
ser bastante escassos.
Por isso, nas recomendações sobre os caminhos a se seguir é dada prioridade às
ações que visem otimizar a aplicação dos recursos, valorizando, sempre que
possível, aquelas de caráter administrativo e gerencial. Por fim, as ações principais
sugeridas são aquelas de caráter público, que cabem ao Estado, em detrimento das
ações que caberiam apenas à iniciativa privada. Também se evita a sugestão de
ações que possam ter caráter paternalista, por entender que tais atitudes não são
função do Estado.
Foram dadas sugestões sobre formas de se enfrentar aqueles que foram
considerados os 10 mais importantes problemas que afetam a aqüicultura
brasileira:
1. Falta de políticas públicas para o desenvolvimento e consolidação da
atividade.
2. Falta de treinamento e qualificação técnica ao longo de toda a cadeia
produtiva da aqüicultura.
3. Dificuldade de acesso ao crédito para investimento e custeio na
aqüicultura.
4. Necessidade de aumento da competitividade da aqüicultura em
pequena e média escala.
5. Necessidade de viabilização, em escala industrial, do processamento
dos produtos derivados da aqüicultura.
6. Necessidade de criação um sistema nacional de controle da sanidade
aqüícola.
7. Necessidade de conquista de novos mercados e consumidores.
8. Necessidade de agilização da regularização ambiental dos
empreendimentos, em especial em águas de domínio da União.
9. Necessidade de levantamento e divulgação de informações setoriais
básicas.
10. Necessidade de fomento ao associativismo e ao cooperativismo.11. Necessidade de desenvolvimento, validação e replicação de modelos
sustentáveis de produção adaptados às diferentes espécies e regiões
do país.
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