segunda-feira, 25 de junho de 2012

TEATRO IPANEMA DE VOLTA

Comprado pela prefeitura, Teatro Ipanema reabre as portas

Para marcar data, convidados especiais se apresentam em três noites na casa

Atores participam das três noites especiais de reabertura do teatro
Foto: O Globo / Mônica Imbuzeiro
Atores participam das três noites especiais de reabertura do teatro O Globo / Mônica Imbuzeiro
RIO - No fundo do quintal da casa de Dona Mocinha havia um barracão. Montado ao lado de uma pequena horta, ele se transformava todos os dias em palco para o seu filho, o ator Rubens Corrêa (1931-1996), que levava para lá sua turma do Tablado. Ali, entre o fim dos anos 1950 e o começo dos 1960, Rubens plantava as sementes de uma raiz teatral que, em 1968, deu origem ao Teatro Ipanema — fundado por ele, Ivan de Albuquerque (1932-2001) e Leyla Ribeiro. Foco de resistência — cruzou a ditadura militar, a especulação imobiliária, os revezes da economia cultural brasileira — e de experimentação artística — inúmeros autores e atores se lançaram e se consagraram por lá —, o Ipanema volta à cena hoje sonhando reacender a magia que contaminou gerações entre os anos 1960 e 80.
Leituras, vídeos e música
Comprado pela prefeitura no começo do ano, reformado e com um novo projeto de curadoria artística aprovado, que começa no dia 2 de julho com a peça "Dentro", o novo Ipanema reabre as portas com a série de shows "Três noites a caminho do mar", criada e dirigida por Hamilton Vaz Pereira.
De segunda a quarta-feira, a programação, com entrada franca, reúne uma série de convidados especiais para celebrar a história do teatro, de seus fundadores e das criações memoráveis que passaram por lá, num roteiro que inclui leituras de peças e cartas, exibição de vídeos, depoimentos, música e, sobretudo, festa.
— Criei um roteiro que explora o lado mais festivo e teatral possível — diz Hamilton. — Será uma mistura de atos que irão relembrar momentos históricos. "Hoje é dia de rock" (peça de José Vicente montada em 1971 e que ficou três anos em cartaz no Ipanema) era uma afirmação de vida em meio àquela terrível ditadura. Rubens e Ivan inspiraram toda a minha geração a viver de teatro. E, o principal, entendi com eles que teatro é bom quando cada um é autor da sua criação. Foi o Ipanema que possibilitou a existência do Asdrúbal Trouxe o Trombone.
Dirigido por Hamilton, o Asdrúbal montou por lá peças como "Trate-me leão" (1978), "Aquela coisa toda" (1980) e "A farra da terra" (1983).
— Eles abriram as portas para a gente, como faziam para muitos da nova geração. Eles tinham o dom da hospitalidade e abrigaram a arte de toda aquela rapaziada.
Batizada de "Corpo dourado", esta noite vai ter como um dos pontos altos a presença de Fernanda Montenegro, que irá ler uma carta escrita por Ivan de Albuquerque a Rubens Corrêa pouco tempo antes da inauguração do teatro.
— É um texto que contém toda a emoção e a ansiedade de um homem. Ivan estava na Europa e louco de vontade de voltar e começar a trabalhar no teatro — conta Hamilton.
‘O assalto’ inaugurou teatro
Logo depois, o diretor Aderbal Freire-Filho e o ator Matheus Nachtergaele leem fragmentos da peça "O assalto", de José Vicente (1945-2007), texto que inaugurou o Ipanema, com uma montagem dirigida por Fauzi Arap. Em seguida, José Wilker e Otávio Müller conduzem a leitura de um dos marcos da história do Ipanema, "O arquiteto e o imperador da Assíria", de Fernando Arrabal, que estreou em 1970 com Rubens Corrêa e Wilker em cena, dirigidos por Ivan de Albuquerque. Wilker recorda que pisou pela primeira vez no Ipanema antes de o teatro ser aberto, numa assembleia teatral contra a ditadura realizada em meios às obras para a construção da sala.
— Anos depois o Rubens me encontrou num café e me fez um convite. Eu estava desencantado com o teatro, disse arrogantemente que não tinha mais paciência, mas aquele texto me fascinou — recorda. — Eu tinha uma relação muito prática com o teatro, uma coisa política, partidária, mas o Rubens me revelou um mundo que eu desconhecia. A convivência com ele representa a minha descoberta do teatro. Seu olhar era muito carinhoso e curioso com os atores. Ele me dava liberdade para trabalhar, me desafiar e me descobrir.

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